Comissão Técnica: Diretores da CVM comentam Impactos da COVID-19 e Assembleias Digitais
Em reunião da Comissão Técnica da Amec da última quarta-feira, 29 de abril, foram realizadas apresentações e debates com os Diretores da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Henrique Machado e Gustavo Gonzalez. Entre os temas discutidos tiveram destaque as novas normas editadas pela CVM e também a agenda regulatória de 2020 considerando o novo cenário.
O Presidente-Executivo da Amec, Fábio Coelho, abriu a reunião lembrando que a Amec realizou encontros de preparação para a temporada de assembleias durantes os meses de janeiro e fevereiro, mas logo no início de março começaram os primeiros casos da COVID-19 no Brasil e houve a interrupção da programação original das AGO pelas companhias, recordou.
Crise Severa
O Diretor Henrique Machado iniciou sua apresentação enfatizando diversos aspectos do impacto econômico da crise sanitária. “Ainda não é possível dimensionar com precisão todos os seus efeitos, mas já é a maior crise dos tempos modernos”, disse. Ele passou dados sobre a redução da perspectiva de crescimento em 2020, a desvalorização dos preços dos ativos, a diminuição de receita das empresas e o fluxo de capital estrangeiro.
O Diretor citou recente levantamento do Centro de Pesquisa Econômica de Cambridge, realizado com 6 mil empresas em 56 países que mostrou que a variação dos preços dos ativos não é linear para as companhias. O principal fator é o quanto as empresas tinham de caixa no final de 2019, ou seja, quanto contavam com liquidez no início de 2020. Outro ponto importante na avaliação é a exposição aos efeitos de COVID-19, de suas redes de suprimentos. Segundo o Diretor, “governança corporativa e responsabilidade social são elementos que mitigaram a variação negativa do preço de ativos”.
Transparência
O primeiro ofício da CVM no início da pandemia foi um alerta de que as companhias abertas deveriam estar atentas. “A primeira análise foi para orientar sobre a necessidade de maior transparência para os investidores. Naquele momento, ainda não tinha sido prorrogado o prazo das Assembleias, mas era importante registrar, na medida do possível, o impacto da pandemia sobre as informações financeiras das companhias”, lembrou Machado. Foi destacada uma atenção maior sobre a publicação de fatos relevantes e a negociação de ativos de posse de informação privilegiada.
Do ponto de vista do regulador, foi adotado um olhar mais próximo para setores mais atingidos pela crise. Além disso, considerando o tempo de análise das medidas já adotadas e daquelas ainda em estudo, isso certamente vai impactar a sequência da agenda regulatória da autarquia nos aspectos quantitativos e qualitativos.
Assembleias
Na sequência, o Diretor Gustavo Gonzalez apresentou breve histórico da legislação que rege a realização das assembleias nas companhias abertas. Começou lembrando que esses encontros foram originalmente concebidos como reuniões exclusivamente presenciais. Isso só mudou em 2011 quando a legislação passou a permitir que a CVM regulamentasse a participação e o voto a distância nas companhias abertas.
O Diretor lembrou que em 2015 foi editada Instrução CVM 561, regulamentando a reforma legislativa de 2011, com ajustes referentes à participação e voto a distância nas assembleias de companhias abertas. Assim, a Instrução 481 foi ajustada e passou a regular não só os pedidos por procuração, previstos desde 2009, como também o boletim de voto a distância e a participação a distância através de um sistema eletrônico.
Esses últimos, contudo, eram de adoção facultativa e não foram utilizados até a crise da COVID-19. Não obstante, desde 2015, já era facultado às companhias a realização de uma assembleia híbrida, que combinasse um componente presencial e um virtual.
Instrução CVM 622/2020
A Medida Provisória 931/2020 concedeu competência para a CVM disciplinar a possibilidade de realização de Assembleias totalmente digitais. Até então deveria sempre ter um componente presencial. No início das discussões, ainda havia uma dúvida sobre a viabilidade de se fazer uma mudança em tempo tão curto. “Começamos com um estudo de direito comparado com outros países. Essa análise consolidou a percepção de que os ajustes poderiam ser pontuais e era viável concluir a reforma em curto espaço de tempo”, lembrou Gonzalez.
Um dos pontos incluídos na nova Instrução foi a possibilidade de se fazer uma assembleia física fora da sede e fora do município. A CVM, contudo, limitou essa possibilidade às companhias que realizem assembleias híbridas, ou seja, que permitam ao acionista participar por um sistema eletrônico. “A norma permite a realização de Assembleia híbrida em qualquer lugar desde que permita ao acionista participar virtualmente. É um ponto interessante, que indica algumas decisões que foram tomadas que são estratégicas para a indução de comportamento”, comentou o Diretor.
Convocação e participação
A Instrução CVM 622/2020 definiu também as regras para a convocação e realização das Assembleias Digitais. Os Diretores da CVM comentaram que uma das primeiras preocupações da Autarquia dizia respeito à informação disponibilizada no anúncio de convocação. Para assembleias exclusivamente digitais, com a expectativa de maior participação de acionistas, foi criada uma regra excepcional em que a companhia pode exigir o depósito prévio de documentos dois dias antes.
Os Diretores explicaram que o novo normativo tratou de não ser prescritivo, evitando entrar em questões operacionais. Ou seja, a instrução evitou entrar em aspectos de regulação dos meios tecnológicos. “Adotamos a neutralidade do ponto de vista tecnológico. A norma procura regular a Assembleia Digital, e não a tecnologia empregada para a sua realização”, disse Gonzalez.
Em relação à participação à distância, foram introduzidos 3 novos requisitos para o sistema eletrônico além daqueles já previstos na norma: o primeiro, a possibilidade de manifestação de acesso simultâneo a documentos apresentados durante a assembleia; o segundo e mais polêmico é a necessidade de a companhia gravar a assembleia; e o último com a possibilidade de comunicação entre acionistas.
Ambiente de negócio
Ao fim da reunião, os Diretores destacaram a importância das medidas voltadas para a melhoria do ambiente de negócio visando a atratividade do mercado brasileiro. Gonzalez ressaltou que “há aspectos relevantes da Lei n° 6.404 que merecem atualização e aperfeiçoamento, inclusive para manter vivo o espírito dos seus idealizadores”. Machado destacou medidas já amadurecidas para a melhoria do ranking Doing Business e concluiu afirmando que “há dever de casa a ser feito a fim de que o Brasil, diante de seu potencial, seja uma jurisdição melhor reconhecida pela sua responsabilidade socioambiental”.
A reunião da Comissão Técnica da Amec serviu também para discutir o impacto na Agenda Regulatória da CVM para 2020. O tema será tratado nas próximas edições do Panorama Amec.