Governo de Joe Biden representa novo impulso global para o ESG
A vitória do democrata Joe Biden nas eleições americanas abrirá novas perspectivas para o fortalecimento das questões ESG no mundo inteiro, com impacto para as empresas e a gestão de investimentos. Evidentemente, as propostas de campanha e os primeiros discursos do futuro presidente dos EUA colocam os temas ambientais e sociais no centro das prioridades. Especialistas e gestores esperam maior alinhamento com as pautas ambientais defendidas pelos países europeus, com um papel de maior protagonismo capitaneado pelo novo governo democrata.
“Acredito que o mais provável é criar um plano de retomada da economia similar ao acordo Europeu, e com isso além de aproximar o bloco da economia europeia, sinalizaria uma pauta e um objetivo comum que visa trabalhar por uma economia mais sustentável e resiliente, visto que o próprio Biden já havia sinalizado um retorno ao Acordo de Paris”, diz Lauro Marins, Diretor do CDP para a América Latina, uma organização global que atua em temas de sustentabilidade.
Como a maior economia do mundo, os EUA devem assumir o papel de liderança na ação ambiental. “Isso inclui o compromisso com reduções maciças de emissões, a transição para energia renovável, a proteção e restauração de ecossistemas e recursos naturais e o investimento em infraestrutura de baixo carbono”, prevê o representante do CDP.
Fábio Alperowitch, Sócio Fundador da Fama Investimentos, aponta que Joe Biden foi eleito com um discurso em que o ESG não é uma questão periférica. “É parte central de seu programa de governo e do discurso, não só ambiental, mas também social. E sabemos que o governo dos EUA exerce influência sobre o mundo inteiro”, comenta. Ele faz uma ressalva, porém, que tudo se trata de especulações pois é necessário ver o que será implementado de fato no futuro governo.
Em todo caso, o gestor da Fama, asset especializada em questões ESG, mostra que já no primeiro discurso após as eleições, Biden mostrou uma mudança radical em relação à política de Trump. O futuro presidente falou em respeito à diversidade e combate à Covid-19 a partir de uma política de valorização da ciência. “Esperamos uma grande mudança de um governo anti-ESG para um governo pró-ESG”, analisa Alperowitch.
Ele lembra que Biden se elegeu com um programa forte para o desenvolvimento de políticas para a redução da emissão de carbono. Se o programa for aplicado, ele acredita que os EUA deverão promover um grande programa de transição energética.
Com previsões otimistas, Lauro Marins acredita que os EUA podem tomar a liderança na pauta do Acordo de Paris uma vez que isso foi sentido na última COP e isso poderá mudar o equilíbrio de forças globais a favor das políticas de sustentabilidade. “A China sozinha não iria tomar grandes iniciativas, bem como o bloco europeu não tinha força suficiente para levar a agenda sozinho. Com isso teremos passos importantes de implementação de acordos bilaterais e descarbonização da economia”, explica.
Na mesma linha, Sônia Favaretto, Especialista em Sustentabilidade e Presidente do Conselho Consultivo do GRI no Brasil, acredita que o novo governo democrata contribuirá para manter a agenda ESG em evidência nos próximos anos. Assim como o advento da pandemia alavancou a relevância das práticas sociais e ambientais para as empresas e mercados, a vitória de Biden será capaz de não deixar essa tendência se enfraquecer em 2021.
Neste sentido, seria o terceiro ano em que os temas ESG estão no centro das preocupações mundiais, pois em 2019 houve o pronunciamento de grandes casas globais de gestão de recursos como a BlackRock; em 2020 com a pandemia de Covid-19 e no ano que vem com a mudança da política do governo americano. “Será muito positivo para a agenda ESG, que crescerá em visibilidade. A política do novo governo deverá promover uma série de estímulos para a economia verde”, prevê Sônia.
Impacto para as empresas
Lauro Marins revela que no reporte ao CDP, as empresas americanas têm sinalizado que a falta de uma política ambiental consistente e a incerteza regulatória nos EUA representa um grande risco para seus negócios. “As empresas precisam da certeza de um jogo de campo nivelado e estabelecido por políticas públicas, especialmente à medida que outras nações em todo o mundo promulgam regras que podem dificultar a capacidade de uma empresa dos EUA para competir enquanto lutam para suavizar requisitos legais e operacionais desiguais em suas operações globais”, comenta o representante do CDP.
De acordo com o relatório da organização, “Putting a price on carbon“, observou-se um aumento constante de 2014 a 2017 nas empresas que participam ou têm expectativa de participação em um Sistema de Comércio de Emissões (ETS). Já no momento em que o relatório foi lançado, era possível ver desenvolvimentos notáveis nos mercados de carbono na China, Coreia do Sul, Canadá e um punhado de estados dos EUA, bem como anúncios relevantes na América Latina e no Sul da Ásia, todos os quais são sendo rastreados por empresas.
“Apesar da incerteza política nos Estados Unidos em relação à regulamentação relacionada ao clima, o número de empresas americanas relatando o uso de um preço interno de carbono continua a aumentar ano a ano”, comenta Marins.
Impacto para o Brasil
Com o novo governo Biden, o Diretor do CDP prevê que o Brasil sofrerá maior pressão na pauta ambiental, em linha ao que já vinha ocorrendo no bloco europeu. “Com certeza vamos ver certa pressão política e econômica no tema, no entanto o Brasil precisa começar a demonstrar uma agenda ambiental mais positiva, reduzir drasticamente o desmatamento e ser ou voltar a ser o protagonista na agenda”, comenta. Ele prevê que o governo Biden deve levar uma agenda mais pesada na próxima COP e ser mais propositivo para questões de meio ambiente e mudança climática.
Para Fábio Alperowitch, se o governo brasileiro continuar com a mesma política, ocorrerá ampliação do isolamento do país na política internacional, com consequências negativas para o comércio exterior. “O governo terá de rediscutir seu posicionamento em relação às pautas ambientais globais”, indica.
O gestor da Fama comenta a valorização do mercado de carbono mundial, agora com a nova postura do governo americano, as empresas brasileiras deverão se posicionar nesta questão. Aquelas que não pagarem por emissões de carbono poderão enfrentar barreiras cada vez mais restritivas para a competitividade no comércio exterior. Já as empresas que possuem crédito de carbono, como Duratex, Klabin e Suzano por exemplo, deverão levar vantagem com o novo cenário global.
Gestão de recursos
Na indústria de gestão de investimentos, Fábio Alperowitch prevê que os ativos ligados à temática ESG, além da provável valorização, tendem a merecer maior atenção. Neste sentido, devem ser analisados com mais atenção os ativos relacionados à energia renovável e combustíveis fósseis. Neste sentido, as assets deverão se preparar cada vez mais para lidar com decisões baseadas no ESG.
“Quem não está preocupado, deve se esforçar, pois a valorização das questões ESG será cada vez mais a tônica dos mercados. Os ativos antagônicos, por exemplo, sofrerão maior pressão. O ambiental e social terão um impulso gigante e esse fenômeno está apenas no início”, projeta Alperowitch.