Redução da liquidez incentiva mudanças na captação de recursos pelas companhias
A alta dos juros, o aumento da aversão ao risco e a consequente redução da liquidez dos investimentos em Bolsa estão produzindo importantes mudanças no financiamento e estruturação das companhias. Se é certo que as empresas aproveitaram a grande janela de IPOs (ofertas iniciais de ações) e Follow Ons aberta em 2020 e 2021, o cenário apresentou uma rápida transformação a partir do mês de setembro passado.
Com os juros em patamares muito baixos, houve forte aumento do número de investidores em Bolsa, com volumes muito maiores que antes. No período entre o início de 2020 até setembro deste ano, os IPOs movimentaram R$ 109,2 bilhões, volume superior aos R$ 71 bilhões da janela anterior de 2006 e 2007. As operações de follow ons dos últimos dois anos também foram maiores, de R$ 135,6 bilhões ante R$ 29,5 bilhões do período anterior.
“Com a recente abertura das taxas de juros, a liquidez sofreu forte redução. Por isso, as empresas estão buscando novas formas de captação. Então, faz todo sentido que busquem novos negócios e apostem em operações de M&A e reorganizações societárias”, diz Guilherme de Morais Vicente, Sócio da Onyx. Ele explica que a janela de IPOs está se fechando devido à redução da liquidez do mercado. “Estamos saindo de um mercado vendedor para um mercado comprador”, comenta.
Nas últimas semanas foram registradas diversas operações de reorganizações societárias tais como do Assai com Grupo Pão de Açúcar (GPA), Jereissati com Iguatemi, Cesp e Votorantim, entre outras. Ainda que cada caso tenha sua motivação específica, eles mostram que as companhias estão se movimentando para levantar recursos e se preparar para o novo momento do mercado.
“O mercado de capitais brasileiro atingiu um nível alto de desenvolvimento e complexidade, com a multiplicação do número de companhias. É um mercado mais pujante com maior número de agentes econômicos”, diz Guilherme, para explicar o aumento do número de reorganizações. Ele acredita que haverá o retorno de uma onda de M&A de companhias. Muitas delas foram a Bolsa nos últimos meses justamente para se capitalizar, com a promessa de sair posteriormente às compras. E daqui em diante, é provável que essas promessas se cumpram.
André Gordon, Sócio e Gestor da GTI acredita que cada operação tenha uma motivação específica. Porém, em geral, as operações societárias servem para destravar os preços dos ativos. É o caso do Assai e GPA que passaram por processo de spin off e mais recentemente anunciaram uma operação de transferência dos pontos de venda. É uma grande operação de compra de pontos de venda dos hipermercados Extra pelo Assai.
O Gestor da GTI acredita que, apesar do fechamento momentâneo da janela de IPOs, que o movimento será retomado em pouco tempo mais. “O mercado vai continuar vendedor e vão continuar os IPOs. Apesar do fechamento momentâneo da janela, devido à menor liquidez e aumento da aversão ao risco, a fila de IPOs ainda é grande e será retomada mais adiante”, comenta Gordon.
Mercado de crédito
Pedro Rudge, Sócio da Leblon Equities, analisa que a janela de IPOs estará fechada pelo menos até o final deste ano. O que motivou esse fechamento de oportunidades foi a rápida deterioração do risco nas últimas semanas com a antecipação das disputas do cenário eleitoral. A alta dos juros e o aumento das incertezas acabou provocando uma forte mudança no comportamento dos investidores em geral. Uma das mais evidentes foi a migração dos investimentos da renda variável para a renda fixa.
As empresas também estão percebendo a mudança do cenário e uma das atitudes é buscar a captação de recursos através da emissão de dívida corporativa. “Estamos verificando um aquecimento do mercado de dívida, com maior número e volume de emissões”, comenta Pedro. Com a alta dos juros, os ativos de crédito privado também passaram a oferecer prêmios mais altos em um movimento contrário ao cenário anterior. Agora está se verificando a migração da renda variável para a renda fixa.