Amec expressa preocupações sobre Voto Plural em carta enviada para CVM, B3 e IMK
A Associação de Investidores do Mercado de Capitais – Amec – enviou carta de posicionamento para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e para a B3, na qual expressa as preocupações de seus associados em relação às discussões em torno ao Voto Plural no Brasil. O tema é discutido na Iniciativa do Mercado de Capitais (IMK), que é um fórum de discussões ligado ao Ministério da Economia, do qual a Amec e representantes de diversas organizações da sociedade civil e instâncias do governo participam para elaborar propostas regulatórias para o desenvolvimento do mercado.
Diante do estágio de discussões sobre o Voto Plural, a Associação decidiu elaborar um posicionamento a partir de um trabalho de sua comissão técnica, na qual participam representantes de assets e fundos de pensão associados. O documento foi enviado na semana passada para o Presidente da CVM, Marcelo Santos Barbosa, e será apresentado na próxima reunião do GT do IMK, que discute aperfeiçoamento da Lei 6.404/1976.
“No contexto do presente debate sobre a alteração da Lei Societária para permitir estruturas de ações com voto alavancado, a Amec enxerga preocupações diante dos riscos que tal modificação geraria na dinâmica do mercado de capitais nacional. Os possíveis ganhos originados com tal modificação, em nossa visão, terão efeitos de curto prazo, ao passo que as consequências nocivas podem ser irreparáveis, com efeitos de longo prazo e com riscos sistêmicos de Governança”, diz introdução da carta, que é assinada pelo Presidente-Executivo, Fábio Coelho.
O tema do voto alavancado, em inglês Super Voting Shares, que na lei brasileira recebe o nome de Voto Plural, ganhou relevância especialmente por conta do surgimento e crescimento de novas empresas de tecnologia. Essas companhias demandam capital para acelerar os investimentos necessários, mas pela natureza do negócio, seus sócios fundadores não demonstram interesse no compartilhamento do controle das decisões estratégicas.
As discussões ganharam mais repercussão após decisão de empresas que optaram por abrir o capital no exterior. “Reconhecemos a necessidade de ampliação da competitividade do mercado de capitais brasileiro de modo a promover seu desenvolvimento, mas o balanço de riscos e oportunidades parece pender para o primeiro, no caso de eventual adoção do voto plural ou outras formas de discriminação de acionistas” diz a carta da Amec.
A Associação defende que as consequências da concorrência mal estruturada entre regras de diferentes mercados globais podem resultar em um “race to the bottom” regulatório que irá prejudicar a resiliência do mercado de capitais brasileiro, sua reputação, e a qualidade de sua governança corporativa. Ainda que existam empresas que seguem elevado nível de governança mantendo mais de uma espécie acionária, é importante mencionar os inúmeros episódios de escândalos societários ocorridos em companhias com estruturas de propriedade alavancadas. Nesses casos, a experiência da Amec revela que muitos acionistas são lesados e não podem contar com estruturas de proteção que são comuns em outros países.
A carta elenca uma série de motivos e argumentos que levam a um posicionamento contrário à regulamentação do Voto Plural no Brasil. “Considerando os elevados riscos da estrutura proposta, a Amec se manifesta contrária à adoção do voto plural no mercado de capitais brasileiro”, diz o documento. A Amec há muito defende a política de uma ação, um voto. Isto se tornou cada vez mais importante à medida em que o debate global sobre o tema causava repercussões locais.
Salvaguardas necessárias
O posicionamento da Amec, contudo, considera que, em caso de se avançar na aprovação do Voto Plural, a Associação defende que sua implementação deveria ser acompanhada de robustas salvaguardas, em especial quando se consideram as características do arcabouço legal e regulatório e todos os demais riscos já mencionados. O documento cita, inclusive, países como Japão, Hong Kong e Singapura, onde o mecanismo foi regulamentado com uma série de salvaguardas para a proteção dos acionistas minoritários.
Na hipótese de se entender que o mercado de capitais brasileiro, o Poder Judiciário e os procedimentos e estrutura de fiscalização e punição pelo órgão regulador estão maduros o suficiente para a adoção do voto plural no Brasil, a Amec propõe a adoção de requisitos mínimos para resguardar os direitos dos acionistas e a credibilidade do mercado de capitais brasileiro. As propostas são as seguintes:
(i) Vedação explícita à adoção do voto plural por companhias abertas já listadas;
(ii) Sunset clause com prazo de até 7 (sete) anos, renovável uma única vez, conforme adotado em outras jurisdições;
(iii) Diante do caráter personalíssimo, que a titularidade de ações com voto plural seja permitida apenas para pessoas naturais, sendo inclusive vedada a sua transferência, a qualquer título, sob pena de perda de tais características;
(iv) Restrição de exercício do voto plural para determinadas deliberações;
(v) Para determinadas situações, incluir mecanismos de direito de retirada mediante reembolso com base no valor econômico, independentemente de condicionantes de liquidez e dispersão das ações.