Entrevista Edison Garcia: Avanços na governança levam ao sucesso na privatização da CEB
Em dezembro último, a Companhia Energética de Brasília (CEB) foi vendida para a Bahia Geração de Energia, do Grupo Neoenergia. O leilão de privatização teve 3 propostas, atingindo ágio de 76,6% sobre o preço mínimo. O vencedor se comprometeu a pagar R$2,51 bilhões para assumir controle da companhia, que antes tinha como controlador principal o GDF – Governo do Distrito Federal. Um dos principais responsáveis pelo processo de privatização é CEO da empresa e ex-Presidente da Amec, Edison Garcia.
O executivo assumiu a CEB em janeiro de 2019, e buscou desde então o fortalecimento da governança da estatal. “Uma das primeiras metas que cumprimos foi a formação da administração da companhia com pessoas técnicas e conselheiros independentes”, diz em entrevista exclusiva ao Panorama Amec.
Confira abaixo seu relato sobre as transformações promovidas na CEB até o leilão de privatização. Na entrevista, Garcia fala também sobre os avanços da Lei de Governança das Estatais, compartilha sua visão do mercado de capitais e da atuação da Amec, do qual foi superintendente e presidente entre 2006 e 2012.
Qual era o maior desafio no processo de privatização?
Quando fui convidado para assumir a direção da CEB, um dos pontos de minha missão era melhorar a governança da empresa. Era uma holding de capital aberto, com ações em Bolsa, sendo que 20% do seu capital era detido por acionistas minoritários, sejam institucionais ou pessoas físicas. Nos últimos anos, os acionistas minoritários vieram apontando problemas que foram objetos de ações judiciais. Eram questões relacionadas à transparência, contratos entre partes relacionadas, negócios que eram questionados e que poderiam gerar algum benefício ao acionista controlador. Não havia uma segregação ou política adequada.
E como foi feita a profissionalização?
Elevamos o padrão de governança. Houve grandes avanços nas métricas, na preparação do balanço, entre outros aspectos. Uma das primeiras metas que cumprimos foi a formação da administração da companhia com pessoas técnicas e conselheiros independentes que tivessem experiência na função. Por exemplo, colocamos como Presidente do Conselho Fiscal, o Reginaldo Alexandre. No Conselho de Administração, buscamos o Walter Albertoni. Para Presidente do Conselho, foi indicado o professor Ivan Camargo, reitor da Universidade de Brasília, além de outros grandes nomes. E fizemos o mesmo na distribuidora do grupo, trazendo nomes como Armando Casado e Renê Sanda, todos altamente qualificados.
Sobre a privatização, como se deu todo o processo?
Precisamos fazer um turnaround antes da privatização. Vários aspectos precisaram ser avaliados nessa mudança de natureza jurídica de companhia estatal de natureza mista para empresa privada. Buscamos bons consultores para modelagem, precificação e análise técnica, além da assessoria do BNDES, que já tinha feito a privatização de outras empresas do setor elétrico. Sabíamos que a privatização permitiria tirar muitas amarras da companhia, que são inerentes em empresas de controle estatal. Agora, teremos melhor capacidade de realizar compras e maior autonomia para realizar a gestão de pessoal, que eram grandes problemas na companhia, inclusive apontados pela Aneel.
E qual sua avaliação da Lei de Governança das Estatais?
A Lei foi um avanço grande. Ela trouxe muitas regras que melhoram efetivamente a governança dessas empresas. O primeiro ponto que destaco é o artigo 17 que disciplina como deve ser realizado o recrutamento de administradores. Então, colocou uma série de orientações para se buscar administradores mais qualificados, com perfil adequado para a função. O diretor, por exemplo, precisa comprovar que tem pelo menos 10 anos de experiência na área. A legislação subiu a régua neste quesito. São critérios que demandam um perfil mais profissional dos indicados. Por outro lado, a legislação veda a indicação de dirigentes de partidos políticos ou que tenham participado de eleições recentemente. De alguma forma, a Lei impõe limitações e orientações para as indicações nas estatais.
E como avaliar o modelo de privatizações do setor elétrico no Brasil?
O setor elétrico é uma área bastante regulada, tem uma agência específica. É um setor bastante testado, seja nas questões jurídicas, da concessão, na atuação da agência, na atuação da concessionária. Não é que não ocorram problemas., mas temos amostras que evidenciam que o sistema regulatório do setor elétrico é bastante consistente. Por exemplo, o Grupo Rede, que atuava em alguns estados, performou mal. A Aneel fez uma intervenção e atuou para a venda do controle da empresa para outro grupo, a Energisa. Ajudou também na transferência para outro concessionário, e tudo funcionou sem sobressalto. Foi um teste interessante. Avalio que a metodologia de tarifação do setor elétrico também funciona bem.
O ano de 2020 foi aquecido para o mercado de capitais. Resgatando a experiência na Amec, como analisa a evolução do mercado brasileiro e os avanços na governança das empresas?
Houve um momento em que os controladores tinham uma postura hegemônica da condução das companhias. A partir daí, vimos a disseminação do papel da governança para geração de valor nas empresas com a multiplicação dos IPOs em 2005 e 2006, com o advento do Novo Mercado, com a criação do CAF e a câmara de arbitragem da Bolsa. Tentamos passar para os controladores que essas medidas geram valor para as companhias. No nosso caso, a ação da CEB valia 23 reais em janeiro de 2019. Agora fechou a mais de 60 reais, ou seja, uma valorização de 170%.