Mudanças nos formatos de comunicação e das Assembleias vieram para ficar

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A chegada devastadora da pandemia de COVID-19, além de provocar profunda crise financeira global, em que ainda não se enxergam claramente as saídas, trouxe por outro lado mudanças positivas para os investidores e as companhias. No Brasil, o Governo Federal e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) correram para regulamentar os novos formatos digitais e híbridos para as Assembleias das Companhias Abertas (Medida Provisória n. 931/2020 e Instrução CVM n. 622/2020).

Ricardo Magalhães, da Argucia Capital. Fonte: Régis Filho/Capital Aberto.

“As Assembleias digitais, em geral, estão funcionando bem, sobretudo daqueles com temas de discussão mais tranquila. Ainda não participei de nenhuma Assembleia ‘belicosa’, que será um teste mais forte, mas por enquanto os novos formatos estão facilitando a maior participação dos acionistas”, diz Ricardo Magalhães, Sócio e CIO da Argucia Capital.

O gestor explica que desde o início da pandemia, houve uma intensificação da comunicação da maioria das companhias com o mercado e com os investidores. “Nunca participei de tantas reuniões quanto nas últimas semanas, isso sem sair de casa. Claro que se perde um pouco do ‘body language’, mas por outro lado, temos mais informações, comunicação e transparência”, comenta o CIO da Argucia.

A impressão é que as Assembleias e o relacionamento dos acionistas com as companhias não voltarão mais ao que eram antes. “As Assembleias virtuais e híbridas vieram para ficar. A pandemia forçou uma migração que o mercado já almejava, que já estava nessa direção”, conta Magalhães. As companhias foram forçadas a acelerar as mudanças, mas ainda depende delas a maior abertura para permitir uma participação mais efetiva de maior número de acionistas.

Conselheiro independente de grandes companhias como a Vale, Cemig e Eternit, Marcelo Gasparino também avalia que os novos formatos chegaram para ficar. “As Assembleias estão se transformando de maneira irreversível, permitindo a participação remotas dos acionistas e conselheiros”, comenta. O fenômeno facilita uma maior representatividade dos investidores das companhias abertas e uma tendência de aumento do quórum das Assembleias.

“Deve ocorrer uma democratização ainda maior do que já vinha acontecendo nos últimos anos, com um maior

Marcelo Gasparino. Fonte: Divulgação.

engajamento dos minoritários. Isso é bastante positivo”, diz. Um exemplo recente foi a Assembleia Geral Ordinária da Vale que foi realizada em 30 de abril passado, com formato híbrido, com a participação de 118 pessoas, entre conselheiros, diretores e investidores, e mais de 30 intervenções. “Foi um aumento relevante de participação em relação a outras Assembleias da companhia”, observa o conselheiro.

Gasparino acredita que o fenômeno será positivo tanto para os gestores de carteiras quanto para as próprias companhias. Ele defende que quanto maior a representatividade dos investidores e a comunicação com as companhias, surgirão melhores condições para o desenvolvimento do mercado de capitais para o financiamento das empresas.

Os novos formatos das Assembleias favorecem ainda o fortalecimento das práticas e princípios de Stewardship, que foi implementado no mercado brasileiro através de ações da Amec (Leia entrevista com Marcelo Gasparino na próxima edição).

Aperfeiçoamentos

Apesar dos avanços dos novos formatos, o mercado ainda espera que mecanismos de participação remota das Assembleias continue se aperfeiçoando. Um ponto que não entrou na recente regulação do Governo Federal e da CVM foi a mudança do Boletim de Voto à Distância (BVD) que, segundo especialistas, já apresentava deficiências e entraves. “O preenchimento do BVD em um grande número de companhias é um trabalho insano. Ainda é necessário preencher um boletim para cada companhia, com procedimentos como o reconhecimento de firmas e outras exigências repetitivas”, diz Ricardo Magalhães.

O gestor defende que o mecanismo deveria passar por uma simplificação. Com a tecnologia e avanços na comunicação disponíveis no momento atual, seria suficiente preencher apenas um modelo de BVD para cada asset, que serviria para voltar em todas as Assembleias. A discussão sobre mudanças no BVD, porém, não entrou na nova regulação da ICVM n. 622/2020.

“Entendo que não deu pra tratar vários aspectos da participação em Assembleias na mesma norma, até mesmo pela necessidade de regular de maneira rápida o formato digital”, reconhece o CIO da Argucia. Ele acredita, porém, que os aperfeiçoamentos no BVD e dos novos formatos de participação, poderão ser discutidos a partir do ano que vem.