Entrevista Bruno Laskowsky: “Nós gostamos de parcerias com assets e queremos dar profundidade para esse mercado”

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A política de investimentos e gestão de recursos do BNDES adotada na gestão do atual presidente da instituição, Gustavo Montezano, representa uma mudança significativa em comparação a períodos anteriores. Em entrevista exclusiva ao Panorama Amec, o Diretor do BNDES e responsável pela BNDESPar, Bruno Laskowsky, explica as mudanças de posicionamento no banco estatal. “Antes os resultados do banco eram medidos com o foco no balanço de crédito, que não deixa de ser um indicador muito importante. Porém, agora estamos priorizando o impacto que geramos na ponta”, disse o executivo em trecho da entrevista.

Com mais de 28 anos de experiência em gestão de negócios, asset management e Real Estate, Laskowsky teve passagens no Credit Suisse, Banco no Brasil, Cyrela Commercial Properties (CCP), entre outras instituições do mercado financeiro. Ao falar das ações que levaram ao desinvestimento de várias posições anteriores e o direcionamento do fomento, o Diretor destaca o papel da indústria de fundos de investimentos e a parceria com o BNDESPar. “Vemos com muito bons olhos o fortalecimento do mercado de gestão de recursos”, comentou Laskowsky. Confira a seguir a entrevista na íntegra:

Bruno Laskowsky, Diretor do BNDES. Foto: Divulgação;

Poderia explicar essa mudança nas prioridades de atuação do BNDES?

Partimos do questionamento do que são os resultados de um banco de fomento. Antes os resultados do banco eram medidos com o foco no balanço de crédito, que não deixa de ser um indicador muito importante. Porém, agora estamos priorizando o impacto que geramos lá na ponta. E isso tem muito a ver com a estratégia de um banco de investimento. O banco de crédito é um business de balanço, que é super importante. Mas nós potencializamos tanto o balanço como o negócio de fee na medida que geramos impacto lá na ponta.

E como se dá esse impacto nas operações?

Vou dar um exemplo concreto. Quando participamos de uma concessão como a Cedae, aqui não utilizamos o balanço do banco, mas a expertise da instituição para auxiliar no processo de concessão. Nós geramos uma outorga para o Estado de cerca de R$ 28 bilhões, mais um capex de aproximadamente R$ 23 bilhões. Então, o que se gerou de riqueza foram mais de R$ 50 bilhões. O importante aqui é que usamos nosso conhecimento no setor de saneamento, o capital humano e a capacidade de estruturar operações complexas.

Mas houve um resultando financeiro considerável, não é mesmo?

Quando estruturamos uma operação de desinvestimento, é claro que tem um resultado financeiro, naquilo que é a atuação de um banco de serviço. E geramos um resultado bastante relevante. Vendemos R$ 77 bilhões de nossa carteira. Mas tem toda uma inteligência da estruturação desse processo de venda, do timing, todo o estudo que fazemos, e tudo isso faz parte de uma expertise de investment banking. Olhamos o vetor que direciona essa estratégia. Mais importante que o balanço, é o impacto que isso vai gerar na sociedade. Se implicar em balanço, ótimo, mas se não implicar, também cumpriremos nosso papel.

Como isso se reflete no tamanho da carteira de renda variável do banco?

Em 2019, a BNDESPar tinha uma carteira de renda variável próxima de R$ 125 bilhões para um patrimônio líquido do banco de R$ 95 bilhões. Isso quer dizer o seguinte, que um banco de fomento, que tem de gerar desenvolvimento, tinha se tornado quase um fundo de ações. O valor da carteira de ações era maior que o próprio patrimônio do banco. Ou seja, havia uma distorção importante. Isso, sem falar nos fatores de risco envolvidos. Então, entendemos que teríamos de mudar a estratégia.

Poderia comentar algumas operações de desinvestimento?

Definimos que era mais relevante sair de posições maduras, como por exemplo, da Vale e da Petrobras, que aproveitamos uma oferta no início de 2020. A venda de Suzano foi outro exemplo. Saímos de uma série de posições, pois percebemos que ao mantê-las, não geraríamos desenvolvimento para o Brasil. Então, tomamos a decisão estratégica de realizar essa reciclagem.

E como ficou a relação atual entre o patrimônio e a carteira de renda variável?

Hoje temos um patrimônio líquido do banco em torno de R$ 120 bilhões para uma carteira de R$ 70 bilhões. Então já alcançamos uma relação mais alinhada com a nova política. O ponto de destaque é que desenvolvemos uma tecnologia para o processo de desinvestimento, usando todas as modalidades possíveis. Recorremos ao follow-on dentro do Brasil e no exterior, fizemos venda de bloco ativo, chamado de accelerated bookbuild, ou ABB, vendemos empresas, fizemos M&A, entre outras operações. Ou seja, utilizamos um amplo arsenal de instrumentos para maximizar valor. Grande parte do aumento do patrimônio do banco foi originado pelas operações de desinvestimento.

Esse movimento vai continuar ou já atingiu seu equilíbrio?

Não temos uma meta específica. Além disso, não podemos dar guidance para o mercado. Mas posso dizer que nesse processo de reciclagem, a gente equilibrou bem mais. Sempre utilizamos uma série de critérios para a tomada de decisões. Os critérios de retorno e preço agora estão ainda mais fortes. Qualquer movimento daqui pra frente, será para gerar valor para o banco. A mensagem é que estamos bem tranquilos. Se o mercado chegar no que queremos, podemos realizar novas operações. Mas se não chegar, não faremos.

O que será priorizado com o caixa gerado pelos desinvestimentos?

Já estamos executando um plano de realocação, ou reciclagem de capital. Temos cinco grandes áreas. Queremos investir em inovação, incentivar o fomento do ecossistema de inovação no país, nas empresas nascentes, nas startups. Um exemplo, é que na semana passada lançamos o BNDES Garagem. Vamos realizar aceleração de mais de 135 empresas startups. Vamos investir desde o softech até o hardtech, em ciclos mais longos. Temos uma visão de longo prazo, que é uma característica fundamental para fomentar a inovação e a tecnologia para nosso país. É fundamental para ampliar a produtividade. 

Outra área central é o crédito privado. Queremos fomentar a geração de crédito na economia, principalmente para o MPME [Micro Pequenas e Médias Empresas]. Temos realizado chamadas para FIDCs, que é uma grande inovação no BNDES. Escolhemos nove gestores em uma chamada pública. Vamos colocar R$ 4 bilhões nesses fundos. Queremos fazer, se não for todo ano, pelo menos ano sim, ano não. Mas a meta é fazer todo ano uma chamada para estimular o crédito privado no país.

O Banco também tem atuado bastante com a vertente ESG. O que você destacaria nessa frente?

Queremos colocar recursos em todo o tema da sustentabilidade. Estamos com um mega projeto para estimular o mercado de crédito de carbono através da alocação de recursos. Queremos fomentar este mercado voluntário para aproveitar as condições do Brasil como potência verde. Também vamos investir recursos em fundos de impacto. São fundos que, além de gerar retorno, também seguem indicadores de melhoria social, de saúde e educação. Por exemplo, vamos investir em uma fábrica de equipamentos médicos. Claro que iremos olhar para o retorno desse capital, mas também levaremos em conta a melhoria do nível de saúde da população. Acabamos de realizar uma chamada para gestores para alocação de cerca de R$1 bilhão.  

Vários desses projetos e chamadas envolvem a indústria de fundos. Poderia comentar o potencial de relacionamento do BNDES com as assets?

Nós acreditamos muito no segmento de asset management. É um segmento que está crescendo muito. As taxas de juros no patamar de um dígito fazem toda diferença. Já sabíamos na teoria, mas agora estamos vendo na prática. E o papel do BNDES é dar profundidade para esse mercado. Nós gostamos da parceria. Vemos com muito bons olhos o fortalecimento do mercado de gestão de recursos.